POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
SEAMUS HEANEY
(Londonderry, 13 de abril de 1939 — Dublin, 30 de agosto de 2013) foi um poeta e escritor irlandês.
Foi agraciado com o Nobel de Literatura de 1995.
Nascido na Irlanda do Norte, Heaney é considerado depois de William Butler Yeats, Bernard Shaw e Samuel Beckett como um dos maiores poetas entre as Irlandas. Era citado frequentemente nos discursos de Bill Clinton.
Tinha como características marcantes em seus versos a força de seu lirismo, a defesa de autonomia da Irlanda do Norte e a presença de motivos épicos e gregos em suas obras.
POESIA SEMPRE - Ano 6 – Número 9 - Rio de Janeiro - Março 1998. Fundação BIBLIOTECA NACIONAL – Departamento Nacional do Livro - Ministério da Cultura. Editor Geral: Antonio Carlos Secchin. Ex. bibl. Antonio Miranda
Oysters
Our shells clacked on the plates.
My tongue was a filling estuary,
My palate hung with starlight:
As I tasted the salty Pleiades
Orion dipped his foot into the water.
Alive and violated,
They lay on their bed of ice:
Bivalves: the split bulb
And philandering sigh of ocean
Millions of them ripped and shucked and scattered.
We had driven to that coast
Through flowers and limestone
And there we were, toasting friendship,
Laying down a perfect memory
In the cool of thatch and crockery.
Over the Alps, packed deep in hay and snow,
The Romans hauled their oysters south to Rome:
I saw damp panniers disgorge
The frond-lipped, brine-stung
Glut of privilege
And was angry that my trust could not repose
In the clear light, like poetry or freedom
Leaning in from sea. I ate the day
Deliberately, that its tang
Might quicken me all into verb, pure verb.
Ostras
Nossas conchas estaladas nos pratos.
Minha língua era uma foz repleta,
O céu de minha boca suspenso com a luz das estrelas:
Como eu degustei as Plêiades salgadas
Órion mergulhou seu pé na água.
Vivas e violadas
Elas colocam suas camadas de gelo:
Bivalves: o bulbo rachado
E namorando sussurros de oceano.
Milhões delas rasgadas e descascadas e espalhadas.
Dirigimo-nos em direção àquela costa
Toda flores e calcário
E ali estivemos, brindando à amizade,
Estabelecendo uma primorosa memória
No frescor da palha e da panela de barro.
Sobre os Alpes, íntimo embalado em feno e neve,
Romanos transportam suas ostras meridionais para Roma:
Vi arremessarem úmidos cestos
As bordas encopadas, os ferrões do mar
Excesso de privilégio
E tanta raiva tive que minha confiança não poderia repousar
Na clara luz, poesia ou liberdade
Inclinando-se dentro do mar. Deliberadamente,
Comi o dia, pois seu gosto picante
Tudo me estimula verbo adentro, verbo puro.
Tradução de Floriano Martins
September Song
In the middle of the way
under the wet of late September
the ash tree flails,
our dog is tearing earth beside the house.
In rising ditches the fern subsides.
Rain-logged berries and stones
are rained upon, acorns
shine from grassy verges every morning.
And it’s nearly over,
our four years in the hedge-school.
If nobody is going to resin a bow
and test the grieving registers for joy
we might as well put on our old record
of John Field’s Nocturnes —
his gifts, waste, solitude, reputation, laughter,
all ‘Dead in Moscow’,
all those gallons of wash for the pure drop,
notes ‘like raindrops, pearls on velvet’.
Remember our American wake?
When we first got footloose
they lifted the roof for us in Belfast,
Hammond, Gunn and McAloon
in full cry till the dawn chorus,
insouciant and purposeful.
Gusts, barking, power-lines shaken
and the music wavering. Inside and out,
babes-in-wood weather. We toe the line
between the tree in leaf and bare tree.
Canção de setembro
No meio do caminho
sob a umidade do tardio setembro
as correias de árvores cinzas,
nosso cão está rasgando a terra perto de casa.
Em valas crescentes descem as samambaias.
Bagas e pedras de água torada
caíram sobre, brilhos
de frutinhas do capinzal bordam cada manhã.
E isto se passa durante
nossos quatro anos no internato.
Se ninguém se encaminha à resina, um arco
e teste, o registro de angústia, pois alegria
bem podemos colocar em nosso velho disco
dos Noturnos de John Field —
seu talento, perda, solidão, respeito, riso,
todo “Morte em Moscou”,
todas aquelas medidas de limpeza pela gota genuína,
não “como gotas de chuva, pérolas no veludo”.
Lembra-se de nossa vigília americana?
Quando encontramos a liberdade pela primeira vez
eles ergueram o telhado para nós em Belfast,
Hammond, Gunn e McAloon
em brados plenos até o coro da madrugada,
despreocupado e intencional.
Ventanias, descascando, fios de energia sacodem
e as músicas flutuando. Dentro e fora,
época de filhotes na floresta. Nos conformamos
entre a árvores folheada e a árvore nua.
Tradução de Floriano Martins
A Dream of Jealousy
Walking with you and another lady
In a wooded parkland, the whispering grass
Ran its fingers through our guessing silence
And the trees opened into a shady
Unexpected clearing where we sat down.
We talking about desire and being jealous,
Our conversation a loose single gown
Or a white picnic tablecloth spread out
Like a book of manners in the wilderness.
‘Show me,’ I said to our companion, ‘what
I have much coveted, your breast’s mauve star.’
And she consented. Oh neither these verses
Nor my prudence, love, can heal your wounded stare.
Uma fantasia de ciúme
Caminhando com você e outra mulher
Num parque arborizado, a grama murmurante
Corre os dedos através de nosso silêncio pensativo
E as árvores abertas dentro de uma sombria
Inesperada clareira onde nos sentamos.
Penso na candura da luz que nos assombrou.
Falamos sobre desejo e pessoas ciumentas,
Nossa conversa um simples roupão desatado
Ou uma branca toalha de piquenique estendida
Como um livro de etiquetas na imensidão.
"Mostra-me”, disse à nossa acompanhante,
“que tenho muito cobiçado o brilho violeta de teus seios.”
E ela consentiu. Oh nenhum desses versos, amor,
Nem minha prudência puderam curar seu olhar ferido.
Tradução de Floriano Martins e Flora Nunes
Página publicada em fevereiro de 2018
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